06 janeiro 2006

Conhecer. Respeitar. Aceitar

“Deus” já serviu de mote a muitas guerras e, à sua conta, os Homens foram justificando diferenças e agressões, conquistas e destruições. Não é de agora que este movimento de hostilização do Outro, pela sua suposta diferença religiosa – ou outra – se abateu sobre o mouro, o judeu, o católico ou o protestante. Mas hoje, a moda é falar de “choque de civilizações” como sinónimo de uma guerra religiosa à nossa porta. Acresce, com excessiva facilidade e óbvio simplismo, a associação ao terrorismo do rótulo islâmico e colagem de tudo isto a comunidades imigrantes. Como se fosse tudo a mesma coisa. O “inimigo” está (re)encontrado.

Presumimos com leveza e ingenuidade que o que nos separa são as diferenças. Assim desculpamo-nos com diferentes Deuses para dissimular a nossa muito humana - e comum - ambição e sede de poder. Mas são essas, que atravessam todos os tempos e todos os homens, que representam verdadeiramente a fonte de todos os conflitos. E configuram o que há de semelhante em nós.

Portugal tem, apesar de tudo, nos últimos anos, sabido conviver com a diversidade religiosa. Com alguma naturalidade e até mesmo um certa curiosidade. Ainda longe do turbilhão do centro da Europa que já levanta muita tempestade, por cá vamos coexistindo pacificamente e sem tensões assinaláveis. Importa, no entanto, ter consciência que a natureza humana, mais tarde ou mais cedo, virá à tona e que a ignorância sobre o Outro – ainda existente, apesar de tudo - será o terreno fértil para as nossas crises. Não nos deixemos embalar pela expectativa dos “brandos costumes”.

Por isso, o estudo "Filhos diferentes, Deuses diferentes", a editar brevemente pelo Observatório da Imigração, da autoria de Susana Pereira Bastos, de Gabriel Pereira Bastos e equipa, representa um contributo muito importante para Portugal. Na medida de uma leitura atenta, ajudar-nos-á, por via da iluminação das diferenças, a descobrir a diferença. Assim reduziremos os nossos medos e veremos o “outro” – na sua afirmação de “filho diferente de um Deus diferente” - como tão diferente quanto eu. Esta valorização das diferenças que o estudo percorre desde comunidades com as quais convivemos há séculos, como as ciganas, até às recentes vagas de cabo-verdianas, sikhs, muçulmanos ismaelitas e sunitas, revela-se, por isso, muito inspirador.

Não se trata, note-se, de normalizar as diferenças, aplanando-as. O que nos é pedido é que optemos por encetar um diálogo, só possível porque as conhecemos, as respeitamos e as aceitamos.

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