19 março 2007

Futebol e Racismo

Recentemente em Paris, viveu-se (mais) um acontecimento trágico, na sequência de um jogo de futebol entre o PSG e uma equipa israelita. No rescaldo violento, pautado pela brutalidade das claques radicais do PSG, onde pontuam múltiplas expressões racistas e xenófobas, um polícia à civil que protegia um adepto israelita, cercado por uma multidão de hooligans franceses, viu-se obrigado a disparar, provocando um morto e um ferido grave. Os alvos da fúria desses adeptos eram, note-se um negro (o polícia à civil) e um judeu (o adepto israelita). As palavras de ordem reflectiam o ódio e a violência.

A França ficou em choque. As declarações de repúdio pela atitude racista da claque e o lamento pela morte de um jovem multiplicaram-se por todos os quadrantes.

Este fenómeno, infelizmente, não é novo. No futebol vão-se expressando, aqui e além, sinais de racismo, nomeadamente de algumas claques principalmente em relação a jogadores africanos. Ainda recentemente na vizinha Espanha, Samuel Eto´o foi vitima de apupos racistas da claque do Saragoça e na Luz alguns portugueses repetiram a mesma atitude, enquanto que também em Portugal vários jogadores sofreram consequências desses gestos.

Felizmente, a FIFA e a UEFA têm dedicado a este tema uma atenção crescente. Para além de campanhas de marketing dinamizadas por toda a parte, apelando à recusa do racismo nos campos de jogo, a Federação Internacional foi este ano mais longe. No passado mês de Março, o Comité Executivo da FIFA decidiu agravar significativamente as penas por actos racistas no futebol. “Agente desportivo que cometa uma ofensa de natureza racista sofrerá uma pesada pena:(nº1) Qualquer pessoa que publicamente humilhe, discrimine ou denigra o nome de alguém de forma difamatória devido à sua raça, cor, língua, religião ou origem étnica, ou cometa qualquer outro acto discriminatório e/ou de desdém, será sujeita a uma suspensão pelo menos por cinco jogos a todos os níveis. Para além disso, será aplicada ao infractor uma interdição de entrar em estádios e uma multa não inferior a 20.000francos suíços. Se o infractor for um agente desportivo, a multa será de pelo menos 30.000 francos suíços.”

Acresce ainda que se o comportamento impróprio for comprovadamente atribuído a uma das equipas perde automaticamente três pontos (1ª ofensa), seis pontos (2ª ofensa) e finalmente será desclassificada à terceira ofensa. Finalmente os espectadores que exibam slogans deste tipo, provocam um dano ao seu clube de 30.000 francos suíços e serão proibidos de entrar nos estádios durante dois anos.

Trata-se, sem dúvida, de um exemplo notável que a Federação Internacional de Futebol nos dá e ao qual a Federação Portuguesa já aderiu. Veremos pois como as autoridades desportivas portuguesas irão impor este novo quadro regulamentar. A tolerância zero em relação ao racismo deve acompanhar a acção positiva de celebração da diversidade e a pedagogia da diferença. Com essa dupla abordagem poderemos ter no futebol um importante instrumento de construção de uma sociedade mais aberta.

Tanto mais que não haverá outro campo como futebol onde, de uma forma tão evidente, se mostrem as vantagens da multiculturalidade. Desde 1995, depois da “lei Bosman” que veio liberalizar o número de jogadores estrangeiros nas equipas, vemos os melhores clubes do mundo optarem por planteis de composição multinacional e, por isso, multicultural. O Chelsea, por exemplo, joga frequentemente com jogadores de oito nacionalidades diferentes e o Benfica actuou recentemente com seis jogadores estrangeiros de quatro nacionalidades diferentes. Esta tendência veio a acentuar-se com a aprovação, em 12 de Abril de 2005, de uma abertura total, sem qualquer tipo de discriminação, a perto de 100 países, determinada pelo Acordão Simutenkov, produzido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

A força da diversidade cultural no futebol deve vencer a violência racista e xenófoba que deve ser definitivamente banida da festa que o desporto sempre deveria ser.
(BI, Dezembro 2006)

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